"Durante o dia, os homens que puxam riquexós nas ruas de Deli poderão trocar uma nota suja por pão (naan) e água. Enquanto o estiverem a mastigar, terão os olhos abertos e sentir-se-ão privilegiados. À sua volta, monges com os braços cortados pelos pulsos, cegos agarrados às paredes, raparigas despenteadas a vasculharem montes de lixo. Ao serão, os homens dobrar-se-ão sobre o banco do riquexó e, após instantes, poderão adormecer por fim. Se alguém chegar e lhes empurrar os ombros, serão capazes de reconstruir a organização dos ossos, passar a palma da mão aberta pelo rosto, lixa, e pedalar até onde for preciso, 10 rupias. O que se espera da vida? Há um corpo, a pele, e há o sofrimento que se é capaz de conceber, o conforto que se desconhece. Zé Luís, os homens que puxam riquexós nas ruas de Deli estão neste momento a sonhar com aquilo que rejeitas e agradecer aquilo que deixaste de sentir. Não são eles que correm o risco de se esquecer da vida, és tu. O teu padrinho tinha uma bicicleta igual àquela com que eles puxam o riquexó. Lembras-te ainda de como soava a sua campainha à entrada da rua de São João? Lembras-te ainda da sua voz quando falava para ti?
Quanto estiveres a ponto de te preocupar com merdas, os dilemas da poesia portuguesa contemporânea, o IRS, o código do multibanco, os carros que te roubam o estacionamento, a falta de rede no telemóvel, as reuniões de condomínios, o tampo da sanita, lembra-te dos homens que puxam riquexós nas ruas de Deli. É essa a tua obrigação.
Nunca te esqueças do mundo, Zé Luís.
Podes estar descansado, Zé Luís. Eu não me esqueço."
José Luís Peixoto, in revista Visão (Abril, 2010)
Acho que hoje estava mesmo a precisar de ler isto...mesmo...mesmo!!
Posso dizer-te que foste tu quem eu escolhi para me acompanhar na minha caminhada...
Sei que tinhas que fazer parte dela...porque tenho aprendido a caminhar contigo...
O que gosto em ti?
Dos teus olhos Da tua humildade Da tua bondade Da tua serenidade Da tua paciência Da tua compreensão Do teu mimo Da maneira como olhas para mim Da força que me dás Do teu abraço quando chego a casa E das tuas torradas
O que não gosto em ti?
Que não me ouças quando estás a ver televisão Que me acordes quando eu adormeço no sofá Que me perguntes o que é que eu estou a pensar Que sejas tão distraído
Não gosto de pessoas interesseiras Não gosto de pessoas falsas Não gosto de pessoas cínicas Não gosto de pessoas frustradas Não gosto de pessoas de mal com a vida Não gosto de pessoas que só contam com a esperteza delas Não gosto de intrigas Não gosto quando as pessoas me desiludem Não gosto de criar ilusões...mas fantasio tanto!!! Não gosto de ser mal interpretada Não gosto de surpresas Não gosto de grupos Não gosto de muita confusão Não gosto de me sentir a mais Não gosto de chegar atrasada Não gosto de filas Não gosto de ir às finanças,sinto-me sempre tão burra! Não gosto de ver os outros tristes Não gosto de ver os outros doentes Não gosto de carne de borrego, vaca, coelho e afins Não gosto de me sentir sozinha Não gosto de ser tão fantasiosa Não gosto quando me acordam Não gosto de política Não gosto de injustiças Não gosto que desconfiem de mim Não gosto de pessoas ciumentas ou invejosas Não gosto de chegar ao final de um dia e ver que não dei o melhor de mim Não gosto de pessoas que nunca têm tempo para ouvir o outro Não gosto de leite Não gosto de obrigações Não gosto de pessoas que vivem da aparência Não gosto de pessoas conflituosas Não gosto de ratos Não gosto de sentir saudades
Ora bem...do que é que eu gosto?
Gosto de mim (eh eh) Gosto da minha família Gosto dos meus amigos Gosto de alguns conhecidos Gosto da minha profissão Gosto de ler Gosto de ouvir música Gosto de cinema Gosto de conduzir Gosto de cantar quando conduzo Gosto de poesia Gosto de azul turquesa Gosto do sol Gosto da lua Gosto do mar Gosto do campo Gosto do Alentejo Gosto da Primavera no Alentejo Gosto de adormecer no sofá Gosto do abraço do meu pai Gosto do olhar da minha mãe Gosto de mimo Gosto de massagens Gosto de sushi Gosto que me mexam no cabelo Gosto de uma boa conversa Gosto de observar Gosto de ouvir Gosto que me surpreendam Gosto de salame de chocolate Gosto de mistérios Gosto de pessoas transparentes Gosto da verdade Gosto de avaliar as pessoas pelo olhar Gosto de dar Gosto de café Gosto de teatro Gosto de um abraço Gosto de um olhar Gosto de estar com boa companhia Gosto de dormir na casa dos meus pais Gosto do cheiro dos lençóis na casa da minha mãe Gosto da comida da mãe Gosto que o meu pai me trate por filhota Gosto de fazer os outros felizes Gosto que os outros se sintam bem junto de mim Gosto de um bom vinho branco gelado Gosto de ouvir a chuva lá fora Gosto de uma boa lareira Gosto de sentir paz à minha volta
Os meus olhos são uns olhos. E é com esses olhos uns Que eu vejo no mundo escolhos Onde outros com outros olhos, Não vêem escolhos nenhuns. Quem diz escolhos diz flores. De tudo o mesmo se diz. Onde uns vêem luto e dores Uns outros descobrem cores Do mais formoso matiz. Nas ruas ou nas estradas Onde passa tanta gente, Uns vêem pedras pisadas, Mas outros, gnomos e fadas Num halo resplandecente. Inútil seguir vizinhos, Querer ser depois ou ser antes. Cada um é seus caminhos. Onde Sancho vê moinhos D. Quixote vê gigantes. Vê moinhos? São moinhos. Vê gigantes? São gigantes.
Quando era pequena, perguntei ao meu irmão, seis anos mais velho do que eu, como é que as pessoas entravam para a televisão. O meu irmão respondeu-me que as pessoas entravam pelo fio que ligava a televisão à tomada. Eu acreditei!! Não percebi muito bem como elas cabiam no fio...mas acreditei!!! Gostava de acreditar em tanta coisa como acreditei naquele dia na explicação do meu irmão!
"A inconstância é uma forma de diferença, mas mesmo a diferença pode ser diferente de dia para dia, de hora para hora, de cada instante inconstante para cada instante inconstante."
José Luis Peixoto
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
Foto: Elisabete
Viana do Castelo
Agosto 2010
Não é fácil viver sem Deus
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Foto: Elisabete
Viana do Castelo
Agosto 2010
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